sexta-feira, 21 de agosto de 2015

Leonard Cohen não é maior que Caetano e Gil

Em minha caminhada apaixonada pelo mundo da música, me tornei profundo admirador de lados discrepantes.

Um dos lados é aquele do Marcelo Nova, que diz que "é baiano, mas não é Caetano", em detrimento a toda "turma do dendê". Essa mesma postura é adotada por críticos/jornalistas que admiro, vide o André Barcinski e André Forastieri. Sempre vi tudo isso com muito humor e certa dose provocativa saudável.

Todavia, outro lado me puxa para as obras do Caetano Veloso e Gilberto Gil, artistas/compositores/criadores que sempre tive muito respeito e admiração. Até quando eles erram - por exemplo, na negação ao boicote de Israel - suas atitudes são carregadas de tanto valor que valem ao menos pela discussão. Resumindo, são artistas ousados e inquietos, e só por isso já mereceriam minha admiração. Mas ambos não são "só" isso.

Ontem tive a oportunidade de vê-los pela primeira vez em cima do palco. E foi maravilhoso! Em uma apresentação minimalista - apenas voz e violão, com pouca iluminação e cenário básico contendo as bandeiras dos estados brasileiros - Caê e Gil mostraram a conhecida riqueza de suas composições e o talento subestimado de suas interpretações.


Logo de cara ambos cantaram em uníssono a bela "Back In Bahia", um blues cheio de saudade composto por um artista exilado. Pouco depois "Tropicália", com direito a impactante frase "eu organizo o movimento" sendo dita por aquele que liderou um dos maiores acontecimentos artísticos do Brasil. Até mesmo uma nova canção de autoria da dupla foi tocada pela primeira vez - histórico! -, falo da tão bobinha quanto graciosa "As Camélia do Quilombo de Leblon".

E choveram outras pérolas: a emocionante/clássica "Sampa", a poesia épica de "Terra", a londrina "Nine Out Of Ten", a estranha (no bom sentido) "Odeio Você" e a belíssima "Tonada de Luna Llena", todas traçando o perfil do Caetano Veloso, um compositor genial e cantor de dramaticidade interpretativa particular.

Puxando a sardinha para o Gilberto Gil - cantor/violonista/compositor espetacular - conferi embasbacado/emocionado a linda "Esotérico", o pop perfeito "Drão", a impactante/tensa "Não Tenho Medo Da Morte" - onde até mesmo o tempo pareceu prendeu a respiração enquanto a canção reverberava no espaço -, a exuberância violonista de "Três Palavras" e a clássica "Expresso 2222". Por mais que prefira os discos de Caetano aos do Gil, no palco é o segundo que rouba a cena.

Já para o final da apresentação, ambos mergulharam no amor pela Bahia e na aproximação com o forró, axé e outros ritmos regionais, vide "São João, Xango Menino" e "Filho de Gandhi". A bossa "Desde Que O Samba é Samba" foi ouvida em maravilhoso silêncio (coisa rara em tempos onde show virou "balada"). Já a espetacular/histórica "Domingo No Parque" inevitavelmente remeteu ao festival da Record de 1967, com direto ao seu final cantado de pé e a plenos pulmões por todo o público. O mesmo ocorreu com a chatinha "A Luz de Tieta", a subestimada "Leãozinho", a interessante "Nossa Gente (Avisa Lá)" e a fraquíssima "Three Little Birds", que fechou o show não fazendo jus a grande apresentação da dupla. Felizmente, já era tarde para abalar duas carreiras de 50 anos de canções emblemáticas.

De certeza, apenas que Caê e Gil são geniais, tanto quanto Leonard Cohen, Bob Dylan, David Bowie ou Paul McCartney. Uma provocação boba dita com seriedade. Não espere eles morrerem para perceber isso.

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